Filme: "COMO ESTRELAS NA TERRA". Emocionante...
O filme: “COMO
ESTRELAS NA TERRA” de autoria de Taare Zameen Par – filme da produção de
Bollywood - conta a história de uma criança que sofre com dislexia e custa
a ser compreendida. Ishaan Awasthi, de 9 anos, já repetiu uma vez o terceiro
período (no sistema educacional indiano) e corre o risco de repetir de novo. As
letras dançam em sua frente, como diz, e não consegue acompanhar as aulas nem
focar sua atenção. Seu pai acredita apenas na hipótese de falta de disciplina e
trata Ishaan com muita rudez e falta de sensibilidade. Após serem chamados na
escola para falar com a diretora, o pai do garoto decide levá-lo a um
internato, sem que a mãe possa dar opinião alguma. Tal atitude só faz regredir
em Ishaan a vontade de aprender e de ser uma criança. Ele visivelmente entra em
depressão, sentindo falta da mãe, do irmão mais velho, da vida… e a filosofia
do internato é a de “disciplinar cavalos selvagens”. Inesperadamente, um
professor substituto de artes entra em cena e tão logo percebe que algo de
errado estava pairando sobre Ishaan. Não demorou para que o diagnóstico de
dislexia ficasse claro para ele, o que o leva a por em prática um ambicioso
plano de resgatar aquele garoto que havia perdido sua réstia de luz e vontade
de viver. O filme, embora não tenha as exóticas cenas de dança, tem músicas que
aparecem como clipes, com imagens que não só ilustram a melodia, mas também
fazem parte do decorrer da história. Dentre as músicas (muito boas, por sinal),
Maa, que significa “mãe” em hindi, recebeu o prêmio de melhor letra.
“Taare Zameen Par –
Every Child is Special“, o que significa, exatamente, “Estrelas
na Terra – Toda Criança é Especial“. Embora o filme fale diretamente sobre
o caso de uma criança, ele é uma mensagem para o mundo sobre o verdadeiro papel
de um educador e formação de um novo ser humano – veja que não digo professor,
mas educador. Ao afirmar no título que toda e qualquer criança é especial, que
são como estrelas na Terra, a proposta é trazer a idéia de que não podemos
negligenciar a diversidade e preciosidade dos projetos de gente de nosso mundo,
pois são eles que fazem o futuro.
O filme vai muito além de tocar na sensibilidade
de ser criança e educador; ele manda uma mensagem de nosso papel como ser
humano – o que na Índia não é tarefa fácil. Aliás, poucos são os próprios
indianos que realmente reconhecem o valor desse filme, muito poucos.
Em muitos momentos, Aamir Khan optou por utilizar
recursos caricatos para os personagens do filme, sobretudo em relação aos
professores de ambas as escolas por que Ishaan passa. Ainda que personagens
caricatos possam trazer um grau de irrealidade para a trama, em Taare Zameen
Par a caricatura contribui para aumentar a sensação de sofrimento, opressão
e incompreensão vivido pelo garoto disléxico. No conjunto, caricaturas e clipes
de música ilustram uma ficção que de irreal nada tem; qualquer semelhança entre
a ficção e a vida real é mera coincidência, diz, antes do filme começar. Mas o
próprio professor Ram Shankar Nikumbh (interpretado por Aamir Khan) lembra às
crianças que Einstein, Agatha Christie, Da Vinci e Tomas Edison eram disléxicos
e sofreram na infância – TZP é história da vida real. Antes fosse apenas
ficção.
Em Taare Zameen Par não há as típicas
cenas de dança dos filmes de Bollywood; as músicas aparecem como clipes,
mostrando cenas que complementam a história que está sendo contada naquele
momento, porém sem diálogos. A primeira a aparecer, por exemplo, mostra a
rotina da casa de Ishaan. Num outro momento, Ishaan sai pra rua e anda pela
cidade (Mumbai), reparando em detalhes não usuais para uma simples criança de
sua idade. Neste momento toca a música Mera Jahan, que, literalmente, significa
Meu Mundo. É o que Ishaan vê e reconhece como fazendo parte integrante. Ao
voltar pra casa ele elabora o que viu fazendo um desenho – a criatividade
artísticas em disléxicos tende a ser mais aflorada, pela sua maneira distinta
com que o mundo é compreendido. A música que ficou mais famosa, porém, foi Maa,
que significa Mãe. Quando passa essa música, Ishaan acaba de chegar no
internato e sofre demais – sua mãe também.
Numa outra música, com o título que dá nome ao
filme, vemos o professor Ram Nikumbh em seu emprego na escola pra crianças
especiais e depois partindo para a casa de Ishaan, onde irá conversar com seus
pais. A música é longa e tão longo é todo esse momento, mas nem percebe-se a
música tocar, dada a imensidão de informações passando. Porém, o detalhe mais
importante desta passagem está no que faz Ram no caminho até a casa de Ishaan,
que não vi indiano nenhum fazendo e nem sequer parando para refletir sobre. No
ônibus, o professor ajuda uma mãe com seu bebê; depois, na beira da estrada,
paga um chá com biscoitos à criança-empregada do estabelecimento. Em outro
momento, andando ao lado da feira, pega a couve-flor que cai no chão. Coisas
simples, mas indianos não costumam fazer coisas simples. Simples ajudas, mas
indianos não costumam ajudar.
Taare Zameen Par vem também cumprir um
importante papel na sociedade indiana. Não se trata de civilizar ou
ocidentalizar, mas de trazer um pouco mais de humanidade para o coração
hindustani, um pouco mais do senso de individuação, que de nada tem a ver com
individualização. Talvez ainda além de mandar uma mensagem sobre o papel do
educador, este filme ensina antes o que é ser pai, o que significa e o que
implica em ter um filho. Ram Nikumbh, contestando o que o pai de Ishaan disse a
ele em certo momento, deixa bem claro o que significa a palavra “cuidar”. E
neste momento sublime, alerta para que não aconteça com Ishaan o que acontece
com as árvores das Ilhas Salomão, que morrem após as pessoas ficarem gritando à
sua volta. Aamir Khan fez uma obra-prima – e talvez a última também. Será
difícil que ele faça um filme tão bom como esse de novo.
Texto extraído e adaptado do blog: